
A reportagem é um pequeno retrato do conceito de
interdependência e complexidade, fundamental para o entendimento de qualquer
discussão sobre desenvolvimento sustentável. Mais do que um conceito, não há
como se pensar em ações para o desenvolvimento sustentável que não sejam
concebidas desta forma. O "fazer" não interdependente inviabiliza até
a melhor das ideias e decisões sobre o tema.
No entanto, nas empresas, governos e no comportamento
social, o receio é geralmente o mesmo: ou todos promovem a mudança para o
desenvolvimento sustentável ou ninguém se atreve, pois mudar sozinho é algo
sentido com insegurança e, quase sempre, considerado economicamente inviável.
Se um dos pontos centrais das discussões da Rio+20 é saber
como equacionar desenvolvimento social e consumo com a preservação ambiental,
sem dúvida seu pano de fundo é a compreensão sobre a necessidade do fazer
sistêmico e integrado. Em outras palavras, da necessidade do salto em conjunto.
Que seria a desejável substituição do famoso "eu só vou se você for",
por um "eu vou, quem vem comigo?".
Mas e as abelhas? Elas invadiram a conferência? Uma pena que
não, pois observá-las seria muito valioso para o bom andamento dos debates na
Rio+20.
O caso do desaparecimento das abelhas é o melhor exemplo de
como apenas uma pequena interferência dentro de um sistema complexo, pode
causar o colapso de uma colônia inteira. Mais que isso, o impacto múltiplo de
uma única variável nas colônias de abelhas, é capaz de resultar no declínio da
polinização de espécies vegetais, e consequentemente na produção de alimentos
em todo mundo, atingindo o abastecimento da população.
Já sabemos que nosso sistema integrado, o planeta em que
vivemos, está exposto há muitas interferências negativas, todas elas de
influência interdependente, sem exceção. Pessoas, abelhas, geladeiras, carros
em oferta e sacolinhas de supermercado. Falando a grosso modo, tudo
influencia tudo. Em contrapartida, quais são as influências positivas que nós estamos
oferecendo para anular estes efeitos de ação interdependente?
Quando falamos em definições para a Rio+20, a opção dos
líderes internacionais por um "não fazer" ou "adiar até 2000 e mais
um pouco", deixando a responsabilidade de atingir metas para uma geração
futura (metas pensadas para uma configuração de mundo, que na época destas
gerações não será mais a mesma) é uma falácia, ou no mínimo uma grande
incompreensão.
Incompreensão sobre o fato de que decisões como as que rumam
o desenvolvimento sustentável, precisam ser plurais e conjuntas para funcionarem.
Precisam trafegar livremente e com consentimento por diferentes esferas da vida
em sociedade, sem travar em pontos obscuros ou mal resolvidos desta rede. Em
resumo, não é possível que somente certos setores, como a sociedade civil organizada
ou parte do empresariado optem por decisões de caráter sustentável, portanto
sistêmico, se outros pontos desta rede, conectados de forma interdependente, obstruam
a efetivação destas ações. E isso pode ser feito, muitas vezes não de forma
deliberadamente mal intencionada, mas apenas inoperante —nem por isso menos
danosa.
Há incompreensão sobre o fato de que o "não
fazer", "adiar" e "só dar o passo quando todo mundo
for", também é de alcance sistêmico e causa grande impacto. Um único
"não" fazer", pequena variável introduzida em um organismo
complexo, tem ação interdependente e multiplicada em seus efeitos e influencia
de forma peculiar o resultado final.
O mais interessante, voltando para as abelhas, é que uma das
etapas resultantes do processo de intervenção no seu ciclo de vida, é a perda
de capital econômico para nós humanos, através da alimentação. Em outras palavras:
perda de dinheiro. Pequenas relações de causa e efeito se ligam em uma
cadeia sem fim entre processos, pessoas, materiais e recursos, nada está
desligado. É por isso que todo o dano socioambiental, em algum momento,
apresenta uma manifestação também na forma de um resultado econômico. Não há
separação entre o que chamamos de recursos, financeiros, humanos ou ambientais,
todo dano custará, em algum momento, algo a alguém.
Não há como fugir da complexidade, nem da natureza. Se nós
separamos em nosso sistema financeiro a correspondência do capital com a vida
real, o planeta não tem nada a ver com isso. Pois para sua lógica, recurso é
recurso, abelhas são abelhas e chefes de Estado são pessoas com grande poder
decisório sobre entradas e saídas destes recursos. Uma vez implementada uma
ação, o sistema corresponderá de forma natural e sem desvios. O prejuízo desta
separação fictícia entre financeiro, social e ambiental, vivenciaremos depois.
Se pensarmos nas abelhas do caso do inseticida, elas não
levaram a substância citada para dentro de suas colmeias. Sua interação sistêmica
foi da ordem do "não fazer" (que na vida social julgamos nula, quase
sem impacto), as abelhas simplesmente se fizeram ausentes em suas colônias, ali
onde eram necessárias, causando impacto em escala nacional. Isso nos mostra que
a ausência, de pessoas ou atitudes, ou o que deixa de ser realizado, é também uma
opção, uma ação que será invariavelmente potencializada pela estrutura da teia
da vida, organizada de forma interdependente.
Agora, nos momentos finais que antecedem a
Rio+20, chefes de Estado com decisões de impacto, da ordem do
"fazer" e do "não fazer", levarão elementos, acordos e
diretrizes de volta para suas colônias. Conscientes ou não no impacto de seus
mínimos atos.
Esperamos que o alto zunido que agora ronda os bastidores e
eventos da Rio+20, seja ao menos ouvido e compreendido pelas esferas de poder.
Caso contrário, nos veremos em pouco tempo consertando não apenas um ou outro
dano social, ambiental e econômico, mas tendo que refazer ponto a ponto, cada pedaço da teia amorosamente tecida para nossa sobrevivência que é a vida.
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